20.12.06

Nunca mais

"Nunca mais o riso branco e nítido do senhor estranho da casa número dez repercutirá distinto.
Nunca mais a impressão de que um desconhecido era o único amigo, quando toda a gente que se abrigava sob o mesmo teto era apenas enfeite.
Nunca mais as retinas estarão coladas aos olhos dela, como cristais puríssimos a interpretar a luz, apenas porque podiam.
Nunca mais suores e cheiros serão legítimos como nas noites imensas em que reunidos num só objeto, estivemos nutridos de amor.
Nunca mais asas de envergadura impossível para alçar os vôos que nunca ninguém tentou, rumo aos destinos absurdos que nossas horas, palavras e versos iniciaram ritmicos.
Nunca mais os enfeites de alma e as tonteiras dos vinhos olímpicos, feitos em outras eras, nas terras que ainda não eram de ninguém.
Nunca mais prudências. Nunca mais a ira.
Nunca mais venenos para restaurar dignidades em atos extremos.
Nunca mais calar vozes e iludir com silêncios a necessidade de pertencer.
Nunca mais a palavra nunca será bradada como riqueza.
Nunca mais meu canto será cantado sem tristeza.
Nunca mais".


José Mattos Neto
(O Livro das Distâncias)

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